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03/03/2021

A ênfase matriacal na Wicca

Já há um bom tempo as pessoas têm desenvolvido as mais complexas dúvidas sobre este assunto, visando o esclarecimento venho explicá-lo.

A WICCA é uma religião politeísta, ou seja, aceita a existência de diversos DEUSES e deusas. Entretanto seu culto é dualista, voltado a uma Deusa-Mãe criadora, cósmica (universal) e imanente (inseparável) a própria criação e a um Deus-Pai igualmente criador, cósmico e imanente.

A Deusa e o Deus são ao mesmo tempo opostos, complementares e necessários não só a criação como também a manutenção da vida. O culto WICCANO expresso nos Sabbaths, Esbbaths e ritualísticas diárias representa o mecanismo para agradecer, exaltar, conectar-se e auxiliar os DEUSES nesse processo.

Se ambos são tão importantes e necessários, porque dar ênfase ao culto da Deusa? Muitas pessoas afirmam que o objetivo disso tem relação com um “combate camuflado” às religiões patriarcais, mas não se trata disso. O objetivo da WICCA não é ser um “cristianismo de saias”, tal ênfase até possui relação com o patriarcado, mas não com as religiões dele e sim com as consequências sociais, culturais e espirituais geradas por ele.

O culto ao divino masculino, independente de como ele é celebrado pelas diferentes religiões, visa o “Dom do Deus”, as características do Deus. Estas representam a razão, lógica, força, atitude, virilidade, ação, coragem, individualidade e etc. Foi exatamente isto que o patriarcado trouxe à sociedade global, todas as pessoas baseiam suas atitudes e pensamentos na lógica, na força, na imposição do poder pessoal, na guerra, na dominação, enfim, tornamo-nos seres ligados unicamente aos dons do Deus.

Tais dons são extremamente importantes, porém viver baseado somente neles traz uma carga de consequências destrutivas sem igual. A lógica não permite a conexão com forças e poderes subjetivos e sutis, ela gera o individualismo, a arrogância, o desnível social e consequentemente propicia um maior número de guerras e um total distanciamento do homem com a natureza, está servindo para dominação.

Em contrapartida temos os “Dons da Deusa” ligados aos sentimentos, sensações, intuição, fertilidade, amabilidade, sensibilidade, conexão com o meio externo e etc. Estes dons também são extremamente importantes, pois propiciam a formação de comunidades e famílias mais unidas, trazem mais sensibilidade às pessoas e permitem uma real conexão entre os seres e organismo a sua volta. O PAGANISMO é essencialmente matriarcal porque ele visa à conexão do homem com a natureza e o responsável por isso é a Deusa.

“Conhece-te a ti mesmo” é a voz do Deus, é o Dom do Deus. Ambas as capacidades são necessárias, se o homem não conhece a si mesmo será incapaz de compreender a natureza à sua volta. Mas ele não pode visar apenas o conhecimento interno, precisa equilibrar as duas coisas para ser pleno em sua existência. O “Mito da Deusa” apresentado no livro "A bruxaria Hoje” de Gerald Gardner, expressa com magnitude o valor de ambos os DEUSES em nossa vida:

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A Deusa nunca amou, mas ela resolve todos os mistérios, mesmo o mistério da morte, e assim ela viajou às terras baixas. Os guardiões dos portais a desafiaram. “Despe teus trajes, tira tuas jóias, pois nada disso podes trazer contigo à nossa terra”. Assim, ela pôs de lado seus trajes e suas jóias e foi amarrada como o eram todos os que entravam nos reinos da Morte, a poderosa.

Tal era sua beleza que a própria Morte se ajoelhou e beijou seus pés, dizendo: “Abençoados sejam esses pés que te trouxeram por estes caminhos. Permanece comigo, mas deixa-me por minha mão fria sobre teu coração”. E ela respondeu: “Eu não te amo. Por que fazes com que todas as coisas que eu amo e que me alegram se apaguem e morram?”. “Dama”, respondeu a Morte, “isto é a idade e o destino, contra os quais não sou de nenhuma ajuda. A idade faz com que todas as coisas feneçam; mas, quando o homem morre ao fim de seu tempo, eu lhe dou descanso, paz e força para que ele possa retornar. Mas tu és adorável. Não retornes; permanece comigo”. Mas ela respondeu: “Eu não te amo”. Então a Morte disse: “Como não recebes minha mão em teu coração, receberás o açoite da Morte”. “Esse é o destino, que seja cumprido”, disse ela, ajoelhando-se. A Morte açoitou-a e ela gritou: “Conheço os sofrimentos do amor”. E a Morte disse: “Abençoada sejas” e lhe deu o beijo quíntuplo, dizendo: “Que possas atingir a FELICIDADE e o conhecimento”.

E ela lhe contou todos os mistérios e eles se amaram e se tornaram um; e ela lhe ensinou todas as magias. Por isso, há três grandes eventos na vida do homem – AMOR , morte e ressurreição no novo corpo – e a magia os controla a todos. Para realizar o AMOR , você deve retornar na mesma época e lugar que os entes amados e deve lembrar-se e amá-lo ou amá-la novamente. Mas, para renascer, você deve morrer e ficar pronto para um novo corpo; para morrer, você deve ter nascido; sem amar você não pode nascer e eis toda a magia. [Gardner, pp. 41-42]

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Este texto maravilhoso explica com vivacidade o processo iniciático da própria Deusa, mostrando que o dom dela é o AMOR , enquanto o dom do Deus (que é a Morte do texto) é o poder da magia e o conhecimento dos mistérios. Para chegar a Deus, para sermos iniciados e renascer, precisamos antes chegar a Deusa e aprender a amar.

É por isso que a WICCA dá ênfase à Deusa e ao feminino, porque para alcançar a iniciação, conhecer e conectar-se ao Deus e se unir em totalidade com a natureza – que é o corpo dos DEUSES – precisamos, antes, conhecer e aprender com a Deusa, pois ela é a Senhora do AMOR, que aprendeu todos os Mistérios e recebeu o dom da Magia.

Ao buscar a Deusa nos tornaremos pessoas mais amáveis, mais conscientes de nossa comunidade, seremos mais sensíveis às necessidades do mundo e nos conectaremos melhor a natureza, consequentemente cavalgaremos ao lado do Deus em sua caçada selvagem em busca da renovação. Dar ênfase a Ela, não significa negar Ele, pelo contrário.

Acredito que ficou tudo bem explicado, mas caso apareçam dúvidas é só perguntar.

Um beijo,

Dayne Anglius.

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 - GARDNER, Gerald. A BRUXARIA Hoje. São Paulo: Madras, 2003.

Fontes: Família Old Religion.